domingo, 10 de outubro de 2010

Do Fundo do Inferno - Parte I

- - No meio de um emaranhado de cobras pretas, uma única cobra branca e robusta rasteja, ela se dirige à saída daquela sala coberta de fogo, onde todas as cobras se encontram, e some em meio à fumaça. - -
- - Numa noite de tempestade, porém quente, um casal se encontra num quarto, à meia luz em seus momentos de intimidade, quando uma grande cobra branca aparece e se arrasta até aonde eles estão, entrando por debaixo dos lençóis e sumindo subitamente depois disso. Como ela está em outra dimensão eles não a podem ver, não antes que ela nasça... como a linda Heidi Sullivan. - -

- Parabéns! É uma linda menina! Como vai se chamar? - Perguntava o médico eufórico.
- Heidi!
- Que nome lindo, ela será uma garota forte e valente, que nem a mãe! Agora eu quero que você descanse, foi um parto bem difícil e... - antes que o médico terminasse, Laura Sullivan trancou a respiração e arregalou os olhos. - Senhora Sullivan? Você está bem? Está me ouvindo? - Em meio às indagações do médico, Laura ficou pior, seu coração saiu do ritmo e ela perdia o ar, ainda de olhos arregalados, naquela frenética tentativa de conseguir respirar, seu coração ia parando, e ela inalava menos ar a cada inspirada que dava, vendo isso, o médico entrou em desespero. - Aaah merda! Ajuda, eu preciso de ajuda aqui! - Gritava o médico, correndo contra o tempo para salvar a vida de Laura.
Senhor Sullivan esperava do lado de fora, seu olhar mostrava o quão tenso, angustiado e triste ele estava: olhava para o relógio, olhava para o chão, passava as mãos no rosto, sentava, encostava a cabeça na parede e fechava seus olhos num gesto de súplica, em seguida levantava, andava de um lado para o outro, ia no balcão e perguntava quanto mais demoraria aquela espera, e fazia tudo isso repetidamente até que o médico chegou. O médico estava com uma cara não muito boa, o que fez Senhor Sullivan se sentir pior, seu coração estava a ponto de explodir, ninguém podia, naquela hora, imaginar o aperto que ele sentia no peito.
- Sinto muito, fizemos tudo o que foi possível, mas ela não aguentou. Você viu como o parto foi sofrido para ela, ela teve hemorragia interna, apresentou alguns sintomas não muito comuns, mas acreditamos que a causa da morte tenha sido porque ela perdeu muito sangue, olhe pelo lado bom, foi melhor para ela, seria muito ruim se ela continuasse entre nós, ela iria sofrer muito, iria sentir muita dor na sua recuperação, e agora ela pode descansar em paz. Sem falar que o bebê nasceu muito saudável e forte, passará essa noite aqui para observação, você pode ficar aqui ou ir para casa descansar. Sua filha estará bem.
- Marcus, o Senhor Sullivan, decidiu ir para casa, deixou alguns papéis por assinar no hospital e saiu sem dar uma palavra, entrou na casa vazia, foi até a cozinha, abriu a gaveta e pegou uma faca, ficou ali refletindo uns bons minutos, sem expressão, nem mesmo lágrimas, tudo lhe passou pela cabeça, principalmente o suicídio, mas sua filha já havia perdido a mãe, seria pior ainda ficar órfã de pai também.
- Senhor Sullivan. - Lá estava o médico novamente, mas com uma carteira na mão. Marcus virou-se para o médico.
- Aah, oi.
- O que está pensando em fazer com esta faca? - Perguntou tou o médico em choque ao ve-lo naquele estado.
- Eu só... Eu só ia preparar o jantar.
O Médico, ingênuo, respirou aliviado, pois não vira que Marcus estava numa completa penumbra, perplexo e quase inconsciente. Também não prestara atenção no fato de que ninguém tenta fazer um jantar, no escuro.
- Nossa, você me assustou Senhor Sullivan.
- Apenas... Me chame de Marcus.
- Claro, claro, me desculpe. Eu trouxe a sua carteira, você deixou no hospital.- O médico entregou a carteira, num gesto tímido e sem jeito, enquanto Marcus continuava sem expressão, ao olhar para o nada. Então o médico falou:
- Desculpe entrar sem bater, a porta estava entreaberta... - Como ele percebeu que Marcus não dava sinal de querer sua companhia ele completou:
- Eu... Já vou indo, até amanhã Marcus. - E foi-se embora sem receber tchau, afinal Marcus nem raciocinava direito, acabara de perder a mulher da sua vida, o seu amor eterno, e teria de criar seu primeiro filho sozinho, lastimando o fato de eles dois serem tão novos, e que ele nunca saberia como seria viver certos momentos da vida com Laura.
No outro dia, bem cedo pela manhã, o telefone tocou. Marcus se encontrava dormindo sentado no sofá... acordou com o barulho e atendeu o telefone:
- Alô! - Disse ele meio irritado e sonolento.
- Alô! - Respondeu a pessoa do outro lado da linha, era novamente o médico.
- Marcus, eu achei que você ficaria muito sozinho, então resolvi ligar para dizer que se você quiser, pode vir buscar sua filha agora cedo, ela está ótima, não precisa mais ficar aqui. -
Marcus caiu na realidade de que estava sozinho e desligou o telefone enquanto o médico falava, pegou a chave do carro e como havia dormido de roupa, saiu em seguida, sem delongas. Mas antes, com as mãos trêmulas, pegou um pote de calmante e tomou dois de uma vez. Ele se olhava no espelho, mas sua mente estava em outro lugar, ele se olhava nos olhos, mas na mente dele, eram os olhos de sua jovem e bela esposa que morrera.
Chegando no hospital, Senhor Sullivan correu ao berçário, mas sua filha não estava lá, ele colocou uma mao no vidro e encostou a testa também, como quem perde as esperanças. Foi quando sentiu uma mão em seu ombro, era o médico com sua filha no colo. Marcus olhou Heidi e sua expressão transformou-se numa mescla de angustia e alegria:
- Que bom que ela está aqui, deixe me segurá-la. - Então, o médico deu a menina para o pai, que ficou emocionado, paralisado, observando sua filha dormir em seus braços, ou pelo menos, fingir que estava dormindo.

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